quinta-feira, 7 de junho de 2007

ESSES MOÇOS NA COCÓ...




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Cinema 03-06-07
"Esses moços" ou as leis da simplicidade
Por Diego Damasceno*

Rente ao asfalto, a câmera absorve os efeitos do calor e reproduz as imagens desfiguradas de duas pequenas silhuetas. Morenas, as duas crianças rumam em direção à cidade de Salvador, que assoma difusa no horizonte, antecedida por um mar azul. Minutos depois, é a visão panorâmica de um plano inclinado que temos: um senhor observa a cidade enquanto desce ao seu encontro. É, enfim, para a parte baixa do centro antigo de Salvador que “Esses moços” (2005), de José Araripe Jr., dirige a nossa atenção.

Aí estão reunidos e bem apresentados os elementos básicos do filme. Cidade, velhice e juventude irão participar, juntos, de uma história que aproxima extremos (ainda que não opostos) e que descobre a doçura em meio à maldade e a ternura em meio ao abandono. Muito simples? Mas não como parece.

Darlane (Flaviana Silva) e Daiane (Chayend Santos), irmãs, fogem da exploração da mãe adotiva. Diomedes (Inaldo Santana) é um senhor que vive num asilo, mas que não se conforma com a perda da liberdade. Do encontro dos três surgirá uma relação que, pautada pela necessidade, passa tanto pelo afeto quanto pelo oportunismo. Enquanto circulam por cantos esquecidos da cidade, percebe-se também uma significativa correspondência entre eles e o espaço que exploram para sobreviver.

É notório que Salvador tem um papel crucial na trama. Porém, o fato de este espaço da cidade ser flexibilizado em prol do sentido da história (pela fotografia, enquadramentos e montagem) não é suficiente para fazer dela “uma personagem”. Este que parece um juízo positivo na verdade empobrece o filme, na medida em que ignora a coerente utilização do espaço cinematográfico e coloca os méritos numa possível (mas não verdadeira) construção narrativa baseada em personagens humanos.

Fazer, no texto crítico, da cidade um personagem é talvez ignorar as potencialidades do uso do pu-espaço no cinema, que ganha vida, sentido e significação sem ter que necessariamente assumir contornos e qualidades humanas. Em uma palavra: a expressão não está restrita ao formato humano, ainda que seja sempre devedor do gênero.

O envelhecimento da cidade forma um contraponto ao trio de personagens principais: quanto a Diomedes, são as marcas de sua história que vemos nas ruínas, no vagão de trem, no prédio do asilo. Fotografias de um assunto desaparecido, mas cuja essência ainda permanece, por sugestão. As imagens da cidade envelhecida apontam para um período não contemplado pelo tempo da narração (a vida anterior de Diomedes), mas que é um tempo que sustenta o personagem e lhe dá sentido. Assim, sua existência ficcional está apoiada pela lembrança, por um passado materializado nas imagens própria cidade em ruínas. Este jogo de correspondências se completa quando alinhamos estas mesmas imagens (desta vez num outro sentido) à memória falha do personagem, que sofre do mal de Alzheimer.

Quanto à Daiane e Darlene, é sua jovialidade promissora (quando tomam banho de mar, quando improvisam uma música ou quando brincam no trem) que se relaciona mais diretamente com o espaço soteropolitano.

O plano geral em que aparecem em fuga na praça Conde dos Arcos é particularmente significativo neste sentido: aquele espaço aparece tanto como fonte de perigo e desamparo quanto como um playground exacerbado, ilimitado. É um plano sintético da posição das personagens na trama: suas possibilidades incertas, seu futuro tornado uma interrogação pela sua condição social, ao lado da sua energia infantil.

Neste plano também percebemos a inteligência fotográfica do filme. Cada seqüência recebe o tratamento adequado – e a fotografia eleva-se como mais um importante elemento significativo. Além deste plano geral, ao qual o meticuloso movimento de câmera e o enquadramento, que parece expandir ao máximo o espaço, conferem agilidade, são notáveis a cena em que Diomedes aparece junto a Darlene num banco de madeira (cuja ternura é devedora da luz suave) e, mais sombria, a cena em que Daiane e o padeiro, na tentativa de recuperar a maleta de Diomedes, cruzam as ruínas de um velho trapiche.

Qualidades assim se sobrepõem aos deslizes de "Esses moços". Com minutos iniciais que chegam ao didatismo, o maior problema do filme está resumido em duas ou três seqüências mal amarradas – como a chegada de Darlene ao asilo de Diomedes, ou a resolução que ela toma no final do filme, que parece muito súbita, talvez precipitada por demais para que soe verossimilhante. Nesses momentos, o filme dá passos mais largos do que devia. O espectador até acompanha, mas pode estranhar.

Há também a participação pouco explicada do ator João Miguel como um visionário que discursa para a câmera quando encontra os personagens no interior de uma igreja. Aparentemente desconectado da trama, a rápida aparição de Rosa não deve ser igualada à de outros personagens – como o matador Militão ou a gangue de pivetes de rua. Este segundo grupo de personagens tem participação limitada mas cumpre função bem definida na história. Ainda, o fato de serem pouco desenvolvidos não leva a crer, por si, que participem apenas como elementos de uma dicotomia maniqueísta – que sejam, apenas, figuras do mal.

Na realidade, estes personagens estão em consonância com a célere seqüência de situações de “Esses moços”. Um filme que trata, em boa medida, do tempo (o passado revisitado e a expectativa de um futuro melhor), “Esses moços” pode ser também descrito a partir da preocupação de Araripe de captar o efêmero em meio à cidade. Se iniciamos o filme na cola das duas meninas fugindo de casa, é com um olhar “selecionador” que encontramos Diomedes, estático no meio da praça, despercebido pela maioria.

Mais que um descuido, retirar os personagens da trama sem “resolvê-los”, dar-lhes um final, é uma opção consciente e de cunho realista: tanto a situação dos meninos de rua como a atuação do matador permanecerão sem solução, parte da paisagem desumana da cidade.

A esta aridez, entretanto, Araripe responde com singeleza. A simplicidade de “Esses moços”, se não deve ser tomada por boa ou ruim, é, sobretudo, coerente. Alinha-se ao ritmo ágil, ao constante movimento sugerido pelas imagens (viagens de trem, a cidade vista do subúrbio, o percurso dos protagonistas), e, porque não, com as resoluções tomadas pelos personagens.

Ao optar pelo simples, Araripe Jr. inverte o jogo e priva o espectador de apoios óbvios e chaves de interpretação comuns. Aparentemente fácil de resumir, "Esses moços" tem uma construção complexa e minuciosa, e ainda assim resulta agradável aos olhos, cativa e emociona. Definitivamente, um filme sobre o qual se pensar. E, se o dinheiro der, um filme para assistir de novo.



*Colaborou Clarissa Rebouças

Um comentário:

Anônimo disse...

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